Segue aqui o debate em torno do Tecnomelody do Pará. Legítima manifestação cultural e artística ou pretexto para a baderna e ultrapassagem dos limites do bom senso. Desta vez a palavra é da advogada Rejane Bastos, presidente da Associação Amigos do Silêncio.Para quem quiser acompanhar a discussão desde o começo, aqui está a
parte um, a
parte dois e a
parte três. Esta é a quarta.
Com a palavra, Rejane Bastos.Olá Timpas,
Acabo de inventar o instituto jurídico "quatréplica" para dar seguimento ao debate.
Agora sim, sem alfinetadas desnecessárias, vamos para o salutar campo dos argumentos.
Comecemos pela discussão sobre classes. Estas existem desde que o mundo é mundo, é fato inconteste, e até hoje não se pode afirmar com precisão o porque desse fenômeno. Até no mais puro comunismo existiam classes: A Dominante ( com subdivisões hierárquicas dentro dela) e o proletariado. Portanto, assumir que se pertença a uma classe com poder aquisitivo maior não é nenhuma novidade reveladora, isto é evidente. Agora, daí a decretar que a classe quer mandar e desmandar no que é bom ou não em termos culturais, assim como, rotular as "elites" dentro de uma visão discriminatória colocando a todos no mesmo balaio de esteriótipos vai uma distância muito grande, Ate porque, como eu já disse, existe uma infinidade de pessoas ricas que gostam de brega, assim como, uma infinidade de pobres que detestam.
Deixei claro também, que a opinião não era da Presidente dos Amigos do Silêncio, para não misturar as estaçõs, a instituição não atribui classe , ritmo, cor, raça ou credo ao barulho.A opinião sobre o ritmo é da pessoa física Rejane que nunca teve receio de irritar confrarias, adeptos ou simples induzidos pela mídia do que quer que seja com sua opinião. Quase me bateram certa vez quando eu disse que não gostava de João Gilberto, considerado gênio, afinal, não consigo nem ouvir o que ele canta! Que genialidade é esta? Não gosto e pronto. Critiquei certas melodias ridículas da Bossa Nova e fui considerada herege. Mas insisto: "O pato, vinha cantando alegremente..qué...qué...", só com muito álcool para achar isso o máximo.
Tive a ousadia de dizer que "Cats", o musical sensação da época não era lá essas coisas, me olhavam com espanto e desprezo. E assim sigo, não me rendendo aos que querem impor algo como sendo bom, e neste diapasão, o tcnomelody na minha opinião não passa de um ritmo voltado exclusivamente para venda, enjoativo ,com letras vulgares e sem a menor arte. Aliás, tem pré requisitos suficientes realmente para estourar no Brasil e no mundo, quem disse que europeus e americanos não gostam de coisa ruim? Quanto ao resto do Brasil isto ainda é mais fácil, no país do Axé, do Tchan, do Funk, do´"só no sapatinho" ," baba baby", entre tantos outras lástimas da mídia, qualquer coisa tem chance, é questão, repito, de uma Marlene Matos na administração.
Na Europa lhe digo que as chances são grandes, nos EUA as coisas complicam, são mais seletivos e preconceituosos, entretanto, a coisa é assim, ele gostam de curtir a bagunça no quintal dos outros. Vem aqui, fazem farra de todo tipo e voltam para seus países quietinhos e santos mantendo as leis e a normalidade. Quem se atrever a alucinar e colocar som alto em casa ou bares abertos, recebe em cinco minutos a visita da polícia. Certa vez em Daytona Beach, conhecida figura paraense pensou que estava em Salinas e ligou o som do carro, em minutos os robocops que patrulham a praia avisaram, ou desliga ou vai preso e fica sem o carro, simples assim.
A diferença é esta, Europa e EUA chegaram à excelência do cumprimento às normas e respeito ao próximo. Existem atividades para todos os tipos e gostos, entretanto, a regra basilar é não incomodar. Tem boates na Espanha que começam às 6:00 da manhã, porém, na rua não se ouve um ruído sequer e nada de gente na porta ou carro com som alto - ou entra ou sai - e lá dentro é só piração com direito a palco móvel. O sujeito alucina sem incomodar ninguém.
Voltando ao barulho em Belém, é inegável que sempre foi uma capital festeira, porém, não era barulhenta. Esse fenômeno foi recente e começou, justamente, com a onda das aparelhagens. O som era moderado e não incomodava tanto. Eu mesma sou testemunha da evolução do barulho. Morava no último andar de um edifício e na rua ao lado havia um barzinho que nem teto tinha. Ali o dono ligava um "três em um" e a turma se divertia muito. Com o som controlado ninguém precisava gritar para falar e o bar não incomodava ninguém, para se ouvir qualquer coisa tinha que ficar na janela, entrou em casa acabou. O sujeito começou a faturar um pouco , comprou um equipamento mais caro e colocou um teto de sapê, ainda assim, mantinha os decibéis e a frequência aumentava. O tempo passa, eu grávida da minha segunda filha vejo chegar umas caixas de som, mas, não imaginei o que vinha pela frente. Fui ter a criança e na primeira noite do bebê em casa aquele som de estremecer todas as janelas anuncia a desgraça: " Mestreeeeee soooommmmm". Daí para frente foi um inferno. Um dj ensandecido não parava de berrar madrugada à dentro e o ritmo - brega. O volume das vozes aumentou na mesma proporção e o local se tornou a filial do inferno para a vizinhança com direito até a tiros e muita brigalhada.
De fato, existem dois focos de discussão: A qualidade do brega como ritmo e a poluição sonora. Fato é que - inexoravelmente - estas estradas se encontram. O que toca nas festas de aparelhagem? O que toca nestes carros/boates que circulam criminosamente acordando todo mundo de madrugada? O que toca naquele vizinho que insiste em obrigar a toda vizinhança a ouvir o som dele? O que toca nas orlas? Garanto que não é rock, bossa nova, tecno, carimbó etc... é o brega, e às vezes ,um goiano perdido com o sertanejo. Por esta razão o brega chama a atenção para si e causa toda essa celeuma. Se não estivesse ligado umbilicalmente com milhares de reclamações que enchem o CIOP, a DPA e a DEMA de denúncias, talvez nem estivéssemos aqui falando dele. Ocorre que é um ritmo tocado nas alturas que incomoda horrores e que corre o risco de ser tombado como patrimônio, isto sim assusta e provoca a polêmica, pois, daí para termos um carro de som em cada esquina é um passo.
Se hoje o cidadão para conseguir a tutela do Estado quando está sendo vítima de poluição sonora já é uma dificuldade, imagina com o tombamento. A polícia quando chamada - se aparecer - vai dizer: " Mas o senhor está reclamando contra um patrimônio histórico tombado, que absurdo!". Vamos correr o risco de responder ação penal sob a capitulação da Lei 9605/98 se quebrarmos o cd da periquita. Imagina o som ambiente de uma cerimônia oficial de Estado: " vou te comer...vou te comer...vou te comer...
Olha Timpas, vamos falar sério, quem quiser faturar horrores com o ritmo que fature, nada contra, Nós já sobrevivemos à "boquinha da garrafa" , " só as cachorras", "créu" e tantas outras bizarrices. Só nos façam um favor, mantenham dentro dos limites das normas federais determinadas pelo CONAMA aquela vozinha prá lá de chata das interpretes do gênero feminino do brega, é só isso que pedimos, de resto, não existe uma guerra em prol da estigmatização de um ritmo, só uma chamada à realidade e ao bom senso, afinal, só aqui inventaram essa graça de se atribuir status de tombamento a um ritmo musical - me perdoe a franqueza - de gosto para lá de duvidoso como tantos outros que já surgiram.